sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Carnaval: Da Catarse às Cinzas

Bloco é bom na rua dos outros
Onde ficaram as balas perdidas, os tiroteios, as mortes de civis e policiais na semana do Carnaval? Será que a violência é inversamente proporcional ao número de blocos e ao volume de pessoas que saem às ruas nessa semana da folia?

A cada ano que passa a multidão se agiganta e superlota todos os bairros. O Leblon foi invadido por milhares de pessoas que ao som de músicas ensurdecedoras, uma quantidade absurda de bebida alcoólica, um calor senegalês, muita vontade festejar, cair na brincadeira, azarar e principalmente extravasar, inundou o bairro.

Presenciamos a um verdadeiro processo catártico. No lugar da crescente violência nas ruas, surge o Carnaval. A população, mesmo que muitos se distanciem das notícias cotidianas, é atacada por tremenda poluição visual, auditiva e sensorial que nos chegam diariamente e que somos obrigados a engolir.

O clima de suspense quanto ao nosso futuro, a descrença, a insegurança, os cofres vazios para enfrentar tantas demandas, o PIB em retrocesso, só podem nos indignar e mexer com o leão adormecido dentro de  nós, ou seja, a agressividade . A explosão interna que teima em nos queimar encontrou nas festas de Momo uma válvula de escape.

As ruas sofreram uma enxurrada de lixo nunca visto, representação concreta de tudo o que temos vivido, a ponto de um batalhão da COMLURB, de vassoura em punho, caminhar junto aos blocos, mas enquanto se procedia à faxina, novos detritos surgiam na retaguarda. Aliviavam-se nas ruas mesmo, sem cerimônia, no clima do vale tudo, e a cada brisa que soprava o odor entrava pelas nossas janelas.

O Carnaval é a imagem do faz de conta, a Guarda Municipal correndo atrás dos ambulantes, que vendem bebidas a menores, e eles se escondendo para voltar um segundo depois. Cabeças esvaziadas e copos cheíssimos. 

Entretanto esse extravasamento mental é passageiro e não possui nenhuma condição de provocar qualquer mudança no congestionamento emocional de nossas vidas e muito menos no clima político, justamente o impossível de acontecer nesses momentos é a capacidade de pensar.

Se para milhares de pessoas a catarse funcionou, para nós moradores do bairro nos trouxe muito desconforto. Trata-se de um grave problema que, tanto a Prefeitura como as Cervejarias incentivam e autorizam, proibindo o trânsito e até a nossa passagem. Tornamo-nos reféns da massa humana que se forma em uma verdadeira esbórnia, ilhados e presos em casa.

Mais tarde as grades se expandiram até a beira da calçada
Curralzinho Privê
A insanidade toma conta das cabeças premiadas da Prefeitura que insistem em desrespeitar as pessoas que ou são idosas ou por outro motivo qualquer não puderam se afastar do Rio. Pode ser muito bom para turistas encontrar já às oito horas da manhã as portas desse monumento à IGNORÂNCIA E IRREVERÊNCIA que se chama BOTECO BELMONTE, um trio elétrico despertando a população que aqui reside.

Agora imagine você, que está lendo, em plena segunda-feira, depois de sobreviver ao caos e ao confinamento do carnaval no Rio de Janeiro, ter seu último direito alijado, a santidade do sono violada pela algazarra que se inicia bem cedo. Lembro-lhe que o carnaval carioca não dura só um dia, ou uma tarde, cada vez começa mais cedo e termina mais tarde, multiplicando sempre o número de blocos.

O prefeito, que se considera acima de qualquer mortal dessa cidade, deve estar envaidecido e inebriado com os turistas que aqui chegaram e que presenciaram não só o Leblon, mas muitos bairros, literalmente fechados para o Carnaval. Deve haver alguma maneira, caso o respeito resolver dar as caras, e o pensamento funcionar, de promover a festa e poupar os moradores dessa asfixia.

A permissividade do Rio é mundialmente conhecida, mas realmente o Prefeito “trabalhador” a reinventou, em especial no Leblon.  

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