sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Do Jeitinho à Tragédia

As notícias recentes me lembraram de um amigo muito querido que, por motivos profissionais, há uns quinze anos, fora transferido para Nova York. Ao regressar, contou-me que tivera uma estadia bastante proveitosa, mas que sentira muita falta do “jeitinho brasileiro”.

A verdade é que o “jeitinho brasileiro” muitas vezes se confunde com corrupção. Afinal, parece que ele passou a fazer parte de modo integral da nossa cultura. Assim, chovem os exemplos de irregularidades e descumprimento das normas estabelecidas para segurança da população.

Os exemplos vão de coisas pequenas como o “sempre cabe mais um” no elevador, embora a placa de sinalização indique a capacidade adequada, à desastres ecológicos monumentais como Mariana, até a juventude perdida na boate Kiss.  

Esta semana mais uma tragédia com o naufrágio na Bahia. Não tenho palavras para explicar a forte comoção que me inundou ao ver a criancinha, sem vida, nos braços do socorrista. Fui às lágrimas.

Quanto sofrimento absurdo as famílias passam perdendo seus entes queridos, ceifando vidas que mal acabaram de nascer. As conclusões periciais quase sempre constatam a presença de irregularidades como superlotação, falta de manutenção etc.

As normas estabelecidas não estão nas posturas municipais e nem no código penal para enfeitar, mas para serem fontes de segurança e de sociabilidade de modo a evitar doenças, acidentes e permitir um convívio adequado. Elas existem para que se tenha uma qualidade de vida melhor. Seria uma maravilha se fossem respeitadas, mas não são.

Quem são os responsáveis por tanta tragédia? Primeiro as autoridades, afinal falta fiscalização e sobra impunidade. Até agora ninguém foi condenado pelo desastre ocorrido em 1988 no Bateau Mouche, que com capacidade de 62 passageiros estava com 142.  Em mar aberto, já adernando, não aceitou as ordens da Capitania dos Portos para regressar. Muitos mortos, todos os responsáveis absolvidos.

Os juízes também precisam se pautar pelo direito de todos, pois   todos são iguais perante a lei. Não podemos aceitar a justiça do compadrio, onde são absolvidos os amigos e condenados os inimigos.

O segundo esquadrão irresponsável é a população. Não gosta e nem aceita regras, flexibilizar, é a regra, e a vida corre como se tudo fosse permitido. Parece que falta a voz interior, um código de ética e de estética, que deve sempre nos comandar, pois a organização social exige que o direito de todos seja preservado.
Não podemos ter um fiscal para cada pessoa.

A onipotência, a rebeldia, o modo infantil de se viver, cada um procurando ser mais esperto que o outro, sem entender que sempre haverá um mais esperto que chegará depois e vai querer sentar-se à janela, como diz o Romário.

Sem utilizar o pensamento em função da coletividade a tragédia é uma certeza. Aqui o evitável é sempre inevitável.

Nenhum comentário:

Postar um comentário